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Moshe o "homem sanguinário"

Foto do escritor: Charton Baggio ScheneiderCharton Baggio Scheneider

A expressão de Zipora, esposa de Moisés, ao chamá-lo de "homem sanguinário" (Êxodo 4:25) tem gerado uma série de interpretações ao longo dos séculos, especialmente no contexto da literatura judaica. A declaração de Zipora ocorre em um episódio pouco discutido, quando Moisés, a caminho do Egito, é atacado por um anjo. Zipora, então, realiza uma cerimônia de circuncisão em seu filho para salvar a vida de Moisés. O motivo pelo qual ela o chama de "homem sanguinário" não está completamente claro, mas diversas interpretações podem ser extraídas de fontes judaicas tradicionais, como o Talmude, os Midrashim e os comentários rabínicos.


1. A Interpretação Literal:

De acordo com a leitura mais simples, a declaração de Zipora pode estar se referindo à situação envolvendo a circuncisão. Moisés não havia circuncidado seu filho, o que teria sido uma violação de um mandamento essencial para os filhos de Israel. A expressão "homem sanguinário" poderia refletir o horror de Zipora ao ver o sangue derramado durante o ato de circuncisão, um procedimento que ela talvez considerasse violento ou cruel, dado seu contexto de estrangeira midiânica.


2. O Significado do Ato de Circuncisão:

A circuncisão era uma prática de grande importância para os judeus e, portanto, a recusa ou negligência de Moisés em realizá-la pode ser vista como um obstáculo espiritual. No entanto, de acordo com alguns comentários do Talmude (Berachot 32a), Zipora possuía uma compreensão limitada dos significados espirituais da circuncisão e poderia ter considerado o ato um gesto desnecessariamente sanguinário. Essa visão pode ser amplificada pela tensão entre os valores estrangeiros de Zipora e os rituais do povo de Israel.


3. A Interpretação de Rashi:

O comentarista Rashi, em seu comentário sobre o versículo em Êxodo 4:25, sugere que Zipora se referiu a Moisés como "homem sanguinário" por causa do sangue da circuncisão, que, de certa forma, a fez ver Moisés como alguém que "trazia sangue". Ela não estava apenas se referindo ao ato de circuncidar seu filho, mas a todo o contexto que envolvia a liderança de Moisés e sua missão divina. Para Rashi, a palavra "sanguinário" reflete o próprio destino de Moisés, que, como líder de Israel, seria um homem frequentemente envolvido com batalhas e derramamento de sangue durante sua jornada para libertar o povo de Israel.


4. A Interpretação do Midrash:

O Midrash Rabá (Exôdo 5:3) apresenta uma versão mais dramática e detalhada dessa história. O Midrash sugere que o ataque do anjo a Moisés não seria apenas uma consequência de sua falha em circuncidar seu filho, mas uma manifestação de uma ameaça espiritual maior. Ao fazer a circuncisão, Zipora não apenas salvou a vida de Moisés, mas também percebeu que a missão de Moisés envolveria grande sofrimento e uma luta constante com forças externas e internas. Ela teria reconhecido que seu marido estava sendo preparado para uma vida marcada por conflitos e sacrifícios, e sua expressão "homem sanguinário" refletiria seu desconforto com o destino cruel que estava sendo imposto a Moisés.


5. A Perspectiva de Maimônides:

O filósofo e teólogo Maimônides também aborda a questão da circuncisão e a sua importância no contexto judaico. Em seus escritos, Maimônides explica que a circuncisão é um sinal do pacto de Abraão, mas para um não-judeu como Zipora, o ato poderia ser um choque cultural, visto como um rito violento ou desnecessário. Assim, Zipora poderia estar reagindo ao que ela via como um ato sanguinário que, em sua perspectiva, parecia despropositado.


6. A Leitura Psicológica e Sociocultural:

Finalmente, outra maneira de interpretar o termo "homem sanguinário" é pela ótica psicológica e sociocultural. Zipora, sendo uma mulher de outra cultura, possivelmente não estava preparada para as exigências espirituais e físicas que Moisés precisava cumprir como líder do povo de Israel. Sua expressão de angústia poderia refletir a tensão entre o seu mundo e a missão divina de seu marido. Além disso, o fato de Moisés precisar ser "confrontado" por sua esposa, que assume uma posição de autoridade para salvar sua vida, indica um dinamismo interessante dentro do casamento, em que Zipora, mesmo com reservas, compreende o papel fundamental de Moisés, mas também questiona os aspectos mais cruéis de sua missão.


Conclusão:

A frase de Zipora, "homem sanguinário", continua a gerar debate nas fontes judaicas, com diversas interpretações que ajudam a aprofundar a compreensão da complexidade do personagem de Moisés e das interações familiares em torno dele. Desde uma reação culturalmente estrangeira à circuncisão até uma visão mais profunda sobre o destino de Moisés como líder do povo de Israel, essa expressão reflete o impacto dos desafios espirituais e pessoais que ele teria que enfrentar em sua missão divina. As obras judaicas tradicionais, como os Midrashim e os comentários rabínicos, fornecem uma riqueza de perspectivas que enriquecem essa discussão.

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